sexta-feira, 6 de junho de 2008

Escuro







Pergunto-me desde quando
deixou de haver futuro
nas janelas.
Janeiro dói nos olhos
como areia
e tu e eu estamos para sempre
sentados às escuras
no Verão.



Rui Pires Cabral




5 comentários:

Anónimo disse...

as escuras do Verão
são quentes
e têm uma luz assim vermelha,
como a desta janela,
daquelas que prende os olhos

V. disse...

ora bem, apetece-me contrapôr, pode ser? :)

Houve um tempo em que minha janela
se abria sobre uma cidade que parecia
ser feita de giz. Perto da janela havia um
pequeno jardim quase seco.
Era uma época de estiagem, de terra
esfarelada, e o jardim parecia morto.
Mas todas as manhãs vinha um pobre
com um balde e, em silêncio, ia atirando
com a mão umas gotas de água sobre
as plantas. Não era uma rega: era uma
espécie de aspersão ritual, para que o
jardim não morresse. E eu olhava para
as plantas, para o homem, para as gotas
de água que caíam de seus dedos
magros e meu coração ficava
completamente feliz.
Às vezes abro a janela e encontro o
jasmineiro em flor. Outras vezes
encontro nuvens espessas. Avisto
crianças que vão para a escola. Pardais
que pulam pelo muro. Gatos que abrem
e fecham os olhos, sonhando com
pardais. Borboletas brancas, duas a
duas, como refelectidas no espelho do ar.
Às vezes um galo canta. Às vezes um
avião passa. Tudo está certo, no seu
lugar, cumprindo o seu destino. E eu me
sinto completamente feliz.
Mas, quando falo dessas pequenas
felicidades certas, que estão diante de
cada janela, uns dizem que essas coisas
não existem, outros que só existem
diante das minhas janelas, e outros,
finalmente, que é preciso aprender a
olhar, para poder vê-las assim.


Cecília Meireles



dizem que o verão está a chegar. que, se não cura, pelo menos acalma as dores nos olhos. e eu, pronto, tenho dias de acreditar que há futuro nas janelas. nessa aí também. (e a fotografia é linda!)

:)

*

menina tóxica disse...

o poema é lindo lindo. e a fotografia encaixa assim tão bem*

lebredoarrozal disse...

este é um dos meus poemas preferidos:)

ana salomé disse...

não há palavras :)