domingo, 28 de dezembro de 2008








Meu corpo é esta árvore,
uma montanha, o rio.
Ninguém o sabe, ninguém
a não ser eu, que o esqueço.


José Corredor-Matheos










segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Magma






Recolheremos todos os dividendos da luz onde antes havíamos recolhido
todos os dividendos do desespero. O que o inevitável nos traz.
Recebê-lo-emos com a temperança dos que esperam sem expectativa,
dos que pressentem as fronteiras da música em cada erro do passado,
em cada equívoco cultivado, em cada golpe sem premeditação,
em cada palavra suspensa antes do arrependimento.
Desse magma – rememorando magma – virá o que impele o sangue
no delta das artérias.



Luís Quintais




Flying club cup




Viana do Castelo, Dezembro 2008




Viana do Castelo, Dezembro 2008




segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

domingo, 23 de novembro de 2008




While Jesus is saving
I'm spending all my grace








Shoegazing





Gato Vadio, Novembro de 2008






Famalicão, Novembro 2008





segunda-feira, 17 de novembro de 2008

3 poemas de Yves Namur



Uma voz
ergueu-se das cavidades do Inverno,

doce e leve
como a palavra sem peso
que vinha da tua boca.

Uma voz terá assim regressado
para perturbar o canto

e
a única pergunta
que ainda se não ousava fazer
às aves da alma.




**




Aquele que entreabre a boca
por um instante que seja,

esse estará talvez esquecido de
que o seu corpo é todo ele feito de aves,
àrvores voadoras e constelações de fogo.

E que desta maneira e pouco a pouco
se esvaziará disso,

de tudo isso.




**




Será o poema essa coisa ínfima
que rodeia o corpo e a ausência?

Essa parte ínfima

que arde
e sempre está a arder
na rosa insuspeitada?





domingo, 9 de novembro de 2008














O teu
corpo é uma nuvem

que se atravessa
de olhos fechados






segunda-feira, 13 de outubro de 2008

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Amsterdam revisited


Estreou por cá há alguns meses mas só ontem pude ver a mestria alquímica
com que Peter Greenaway dá vida, luz e treva a Rembrandt, na belíssima Ronda da Noite.





segunda-feira, 29 de setembro de 2008







Lamento de Calipso



Primeiro foi o bule,
de seguida foi a asa.
Que mais irás quebrar.

Não sei o que fazer com o teu sim,
o teu não, o teu
passa-me o açúcar.

A distância dos teus olhos não a sei
abreviar, o latido dos teus sonhos
não me deixa adormecer.

Gostava de te amar um pouco menos,
de voltar ao meu rebanho
de feridas e sopores,
regressar ao rijo barro dos Domingos
em que não te conhecia,
ao supor de suas tardes

Quando ainda não sabia
Da dureza do cimento, nem dos modos
De quebrar e ser quebrado.




José Miguel Silva



segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Memória






e vinha a luz
e guardava-te

e eu guardava-te
também

em lugares mais seguros
que fotografias
ou poemas



gil t. sousa




segunda-feira, 15 de setembro de 2008

what's there milady, underneath the fog?




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Jardins da Fundação Calouste Gulbenkian, Agosto 2008




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Amesterdão, Agosto 2008




Photobucket
Amesterdão, Agosto 2008






quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Um bom par de chapadas




Quando se está completamente farto
Quando se esgotou tudo
O vinho o amor as cartas
Quando se perdeu o vicio
Das sopas de camarões
Das salsichas de Sarthe
Quando a visão de um strip-tease
Nos faz dizer: que parvoíce
Não arranjaram melhor
Ainda resta um jeito
Que nunca perde o efeito
De ver a vida a cor-de-rosa

Um par de chapadas na tromba
Um bom pontapé no cu
Um murraço nas queixadas
Dá-nos outra juventude
Um bom par de chapadas na tromba
Um directo em cheio no estomago
Os dedos dos pés debaixo duma mó
Um biqueiro em pleno trálálá
Apaga tudo, a droga e a aspirina
Os espinafres, o snif e a Badoit
É mais bacana que o foie gras em terrina
Pois é menos caro e não engorda
Um bom par de chapadas na tromba
E a vida volta a ter valor
Numa manhã em que nos sintamos sós
Toca a partir a cara entre amigos

Quando ela deu de frosque
Levando o dinheiro
E a máquina de costura
Deixando-nos o lava-louça
Cheio de louça por lavar
E sal no pote do açucar
Quando o nosso melhor amigo
Telefona no dia seguinte
Dizendo: vem-na buscar
A gente casquina e pensa
Espera um pouco Hortência
Vais ver o que vais levar

Um par de chapadas na tromba
Um bom pontapé no cu
Um murraço nas queixadas
Dá-nos outra juventude
Um bom par de chapadas na tromba
Um directo em cheio no estomago
Os dedos dos pés debaixo duma mó
Um biqueiro em pleno trálálá
Aborrecias-te no meu quartinho
Suspiravas, querias coisa nova
Doravante de Janeiro a Dezembro
Conta comigo para te servir à descrição
Um bom par de chapadas na tromba
Isso há-de consolar-me minha rica
Dos serões em que manipulavas
O rolo da massa
Toma lá cabra.




Boris Vian




segunda-feira, 8 de setembro de 2008

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Back (but not for good)








I've been running on a no-tomorrow road at great speed







segunda-feira, 14 de julho de 2008

this is only a series of distraction until we die ou como ainda me sinto um puto (with fucked up liver n' lungs)



Esta semana atinjo a thin red line dos 30.
Disse-me há pouco uma amiga que as mulheres ressentem-se
muito mais com o galopar da idade do que os homens. É provável.
Eu aceito-a tranquilamente, sem receios, sem dramas, sem neuroses.

Isto porque hoje sou mais eu do que nunca.



Looking for astronauts




Afinal quem é que vem ao piquenique de dia 18?





quarta-feira, 9 de julho de 2008

segunda-feira, 7 de julho de 2008





Me acerco al fuego
que todo lo quema















terça-feira, 1 de julho de 2008






Levemos o nosso desejo pagão para a cama, Lídia.
Estou farto de olhar o rio!











segunda-feira, 30 de junho de 2008

Wait in the fire



Wait in the fire...

and she weeps on my arm
walking to the bright lights in sorrow
oh drink a bit of wine we both might go tomorrow
oh my love

Wait in the fire...












sexta-feira, 27 de junho de 2008

Nos semáforos da Rua de Santa Catarina




Ao menos
os teus olhos permanecem
verdes todo o ano



Jorge de Sousa Braga










quarta-feira, 18 de junho de 2008




Escrevo como um profissional, à linha, as palavras pouco importam, são ambíguas e inúteis. As palavras não somos nós. E tu, leitor, és um pretexto: testemunha, confidente, cúmplice, vítima ou juiz, jamais nos conheceremos, jamais saberás quem sou, onde te minto, onde chorei, onde nos podíamos ambos rir a bom rir da nossa pavorosa condição de gente morta ou gente que vai morrer.


Luiz Pacheco




Um ano, três dias e algumas horas





Só hoje me apercebi, mas este blog aniversariou.




terça-feira, 10 de junho de 2008

Vernaculum




repara: fechas os olhos
para perscrutar a boca
tal como fazes para
entrar no sonho.

de nenhum sairás
inteira.






My mind is a dark alley




Croácia, Agosto 2007





Croácia, Agosto 2007



sexta-feira, 6 de junho de 2008







Escuro







Pergunto-me desde quando
deixou de haver futuro
nas janelas.
Janeiro dói nos olhos
como areia
e tu e eu estamos para sempre
sentados às escuras
no Verão.



Rui Pires Cabral




domingo, 1 de junho de 2008

Clubbing espasmódico + A Naifa




Vampire Weekend



These New Puritans

Foram dois concertos muito curtos mas em compensação bastante enérgicos e intensos. O acne marcou forte presença (tanto em baixo como em cima do palco), mas nem por isso os VW deixaram de ter uma performance sem mácula. Não houve deslumbramento nem transcendência, mas também não me parece que (ainda?) haja lugar para isso na música afro-new-wave-brit-pop or whatever deles. Pop sem 'compromissos' de maior. E essa leveza também cai bem de quando em vez.
Quanto a These New Puritans: it was my favorite number. enough said.



A Naifa

A consagração, no Theatro Circo (a sala encaixa-lhes perfeitamente).



quarta-feira, 28 de maio de 2008




Os meus olhos nos teus
os teus olhos nos meus

e mais ninguém junto a nós,
nem Deus




Vieira da Silva











quinta-feira, 22 de maio de 2008

Well, you better hold my hand through this*



My mind's not right
My mind's not right
My mind's not right
[repeat]









As bocas cortam mais fundo
na escuridão






Inside the wall



You made a fukin' hell of a job with my heart!



sexta-feira, 16 de maio de 2008










Break the chain

Desde que sou blogger (nao sei porquê mas isto não me soou nada bem)
que sou avesso a todo o tipo de correntes e afins.
E isto não é novidade
nenhuma, pelo menos para quem vai passando por aqui há já algum tempo.
No entanto, e como é óbvio, não deixa de me agradar que por esta ou
aquela razão, CERTAS pessoas me incluam nas suas escolhas.
Nada mudou, e a corrente será novamente quebrada, mas desta vez
apeteceu-me subvertê-la. Em vez das tais palavras 'autobiográficas'
pedidas, vou pegar num punhado delas e endereçá-las a quem

me 'acorrentou'.

E porque muitas vezes as palavras se nos colam à pele,
estas são as que eu 'leio' sobre o 'picotado' da vossa:

Ângela e Vanessa:

coração, autenticidade, ternura, sensibilidade, paixãocompaixão, sonho,
doçura, luz, graciosidade, genuinidade, transparência. do que é puru.

Obrigado*

(E agora não me voltem a embrulhar nestas porras ok? chega de lamechice ;))



domingo, 11 de maio de 2008

De profundis amamus



Ontem
às onze
fumaste
um cigarro
encontrei-te
sentado
ficámos para perder
todos os teus eléctricos
os meus
estavam perdidos
por natureza própria

Andámos
dez quilómetros
a pé
ninguém nos viu passar
excepto
claro
os porteiros
é da natureza das coisas
ser-se visto
pelos porteiros

Olha
como só tu sabes olhar
a rua os costumes

O Público
o vinco das tuas calças
está cheio de frio
e há quatro mil pessoas interessadas
nisso

Não faz mal abracem-me
os teus olhos
de extremo a extremo azuis
vai ser assim durante muito tempo
decorrerão muitos séculos antes de nós
mas não te importes
não te importes
muito
nós só temos a ver
com o presente
perfeito
corsários de olhos de gato intransponível
maravilhados maravilhosos únicos
nem pretérito nem futuro tem
o estranho verbo nosso.



Mário Cesariny de Vasconcelos




Old Jerusalem




Guimarães Maio 2008



Guimarães Maio 2008



Guimarães Maio 2008




segunda-feira, 5 de maio de 2008

sábado, 3 de maio de 2008





Quero descansar sob a sombra
de um beijo na testa


















quarta-feira, 30 de abril de 2008

Narração de um homem em maio



Estou deitado no nome: maio, e sou uma pessoa
que saiu
violenta e violentamente para o campo.
Um homem deitado entre os malmequeres
rotativos do mês atraves-
sado pelo movimento.
É a noite aproximada com o livro
dentro. Deitado sobre bocados
de estrelas no pensamento.
Era a casa absorvida na manhã
embatente.
Livro de poesia arrebatada. Poesia
da mulher emparedada no amor
e o homem emparedado na destruição
do amor.
É agora o leitor com a atenção corrupta
sobre o livro.
O livro que arde nos ossos
do leitor afogado no poema arrebatado.

Estou estendido como autor na ligeira
palavra que a noite molha
e os ventos sopram como se sopra
uma brasa.
Um homem que saiu de casa, com toda
a magnífica violência do amor.
É o tempo revelador.
Agora inteligente deste lado,
contra o lado exemplar de maio aglomerado.
Espécie de primavera comburente.
A dor total. O livro.
O pensamento do amor. A
experiência.
E a vida ardente do autor.

Deitei-me também no campo
de outras coisas. Com discurso. Com
rigoroso segredo.
Vi o caçador levantar o arco-íris
e atirar, fechada, a morte
ao cabrito primaveril.
E tudo calei como experiência
de um sono inspirado.
Vi a ressurreição, maio
infestado. Ouvi
passar o ciclista da primavera
sobre o ruído da ressurreição.
Conheci a existência do roubador, o ciclista
que penetra no exemplo da fábula.
Estou deitado em meio campo
de uma espécie de despedida.
Meio campo de maio, e outro meio
de pessoalíssima vida.

São coisas que já não estão mais
do que na maturidade da idade.
Fiz comércio. Indústria. Dor.
A garganta lavrada pelo canto.
Ia a bicicleta com o seu poeta que punha a mão
no poema da bicicleta.
E iam todos - poema, bicicleta, poeta e mão -
por sobre o coração da terra e a ressurreição
da primavera. Ganhei
a minha idade concluída.
Cacei. Ou plantei. Ou cortei.
A vida vida.
Havia o movimento com a sua bicicleta
e a canção com o seu poeta.
A vida merecida.

Vejo ervas movimentadas e estrelas paradas.
E a consumação das coisas universais.
Geram-se de novo as coisas
universais. A pureza.
A natureza da pureza.
A própria natureza das coisas universais.
Da dor sei o amor.
O amor do ardor. Sei mais
do que posso saber da matéria do amor.
Fico deitado no campo revolucionário:
a paciente brutalidade da primavera
é como a brutalidade
delicada da paixão.
O violentamente demorado amor,
e a sua ressurreição.

Já estivera deitado ao lado das mulheres.
Elas paravam completamente
como caçadores ou bichos fascinados.
Não tinham pensamento nem idade.
Era a força do corpo. O movimento.
Estou neste lado desse lado
do corpo. Sei o poema
do conhecimento informulado.
Respira monotonamente uma estrela
entre os ossos.
Estrela levemente destruída.
Roída pelo louco rato lírico
da idade. Estou no pensamento.
Parado no movimento de uma vida.

Mexo a boca, mexo os dedos, mexo
a ideia da experiência.
Não mexo no arrependimento.
Pois o corpo é interno e eterno
do seu corpo.
Não tenho inocência, mas o dom
de toda uma inocência.
E lentidão ou harmonia.
Poesia sem perdão ou esquecimento.
Idade de poesia





Herberto Helder




segunda-feira, 28 de abril de 2008

Into the heart of flowers



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Ponte de Lima, Fevereiro 2008




O apontamento tardio (à espera das fotos que ainda não chegaram)





Com um conjunto de álbuns e canções mais do que suficientes para nos
presentear com um concerto-best-of, Nick Cave e a troupe optaram
(e bem digo eu) por nos atacar com os venenos mais frescos, e nem o facto
de aqui e ali se notarem pequenas falhas de entrosamento devido à longa
ausência dos palcos, tirou brilho ao espectáculo.
Nick Cave sente-se bem nesta nova roupagem mais crua e rockenrollesca

e foi igual a si próprio: enérgico, intenso, comunicador corrosivo
e mau feitio indisfarçável. Pregou e deu-se ao endeusamento.
Tudo o resto foi rendição e sabor a pouco.





quarta-feira, 23 de abril de 2008

Vamos por partes...







Carrego as mãos como flores
tardias.







Inside job






O poeta lançado aos lobos
da realidade.






domingo, 20 de abril de 2008

sexta-feira, 18 de abril de 2008

3 poemas de Casimiro de Brito



Meus pensamentos são nómadas


Meus pensamentos são nómadas
e vagarosos

como a água que vem da montanha
e não sabe nada

do coração dos homens.
O meu, por exemplo,
tem a leveza do vento

e corre para casa como se fosse
um cão que precede
os passos do dono.



*



46


A guerra dos homens não inibiu
As cores do arco-íris: O mundo está pois
No seu caminho, no campo raso onde respiram
Os insetos silenciosos da morte. Os homens
Deslizam insaciáveis com o desejo
Virado para o céu. O corpo está pois
No bom caminho: A boca na terra
De quem vive apenas
Este momento.



*



Se eu pudesse deixar de correr
Caminhava se eu pudesse deixar de caminhar
Sentava-me à sombra da nogueira azul do céu
Se eu pudesse deitar-me deitava-me
Numa cova com a forma do meu corpo em
Repouso se eu pudesse deixar de cantar
Fechava os olhos e olhava o alto vazio
Onde não acontece nada a não ser
A conciliação provisória do caos
E da luz que não se cansa de nascer.



quinta-feira, 17 de abril de 2008

Oblivion






Nenhum dia é suficientemente longo
para te esquecer





terça-feira, 15 de abril de 2008

Anedota búlgara



Era uma vez um czar naturalista
que caçava homens.
Quando lhe disseram que também se caçam
borboletas e andorinhas,
ficou muito espantado
e achou uma barbaridade.


Carlos Drummond de Andrade



sábado, 12 de abril de 2008

terça-feira, 8 de abril de 2008

Felicidade



Felicidade - o título tão comprido deste poema tão pequeno!
Felicidade - substantivo comum, feminino, singular, polissilábico.
Tão polissilábico. Tão singular. Tão feminino. E tão pouco comum.
Substantivo complicado, metafísico,
que cabe todo
na beleza clara de alguém que eu sei
e no sorriso sem dentes do meu filho.



Abgar Renault



4 poemas em carne viva














domingo, 6 de abril de 2008





We Can't be saved












Postcards from Italy




Finlândia, Setembro 2007



Finlândia, Setembro 2007



Finlândia, Setembro 2007



Croácia, Agosto 2007



Croácia, Agosto 2007



Poema em linha recta



Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.

E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo.
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cómico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado
[sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um acto ridículo, nunca sofreu um enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó principes, meus irmãos,

Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e erróneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.




Álvaro de Campos



quarta-feira, 2 de abril de 2008

segunda-feira, 31 de março de 2008

The post-hit collection # 19



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1.
Subjugar os dedos
à bebedeira do poema.

2.
Esvaír-me nas arestas
do silêncio.

3.
Andar pelos cantos
da boca
com os olhos em
combustão.

4.
Passar pela vida entre comas.

5.
Usar o punhal
como aforismo.

6.
Ultimar a transladação
para o vazio.

7.
Morrer de improviso






domingo, 30 de março de 2008

sexta-feira, 28 de março de 2008

Testing # 2


Esta pequena amostra é o resultado de algumas experimentações
sonoras que tenho vindo a produzir no pc.
Apesar de já ter o 'esqueleto' de várias músicas preparadas,
há ainda muito a desenvolver e a praticar/experimentar,
uma vez que o processo criativo é muito diferente daquele
a que estou habituado.


Aqui vai:




(para quem não consegue ouvir directamente no player,
fica o link para download)




terça-feira, 25 de março de 2008

Antes que fales, deixa-me dizer-te:




O silêncio pode tomar-me mais que uma vida.





domingo, 23 de março de 2008

The lovers



Barcelona, Dezembro 2007





Três poemas de Alexandre O'Neill



Fala


Fala a sério e fala no gozo
Fá-la pela calada e fala claro
Fala deveras saboroso
Fala barato e fala caro
Fala ao ouvido fala ao coração
Falinhas mansas ou palavrão
Fala à miúda mas fá-la bem
Fala ao teu pai mas ouve a tua mãe
Fala francês fala béu-béu
Fala fininho e fala grosso
Desentulha a garganta levanta o pescoço
Fala como se falar fosse andar
Fala com elegância - muito e devagar.




*



Auto-retrato


O'Neill (Alexandre), moreno português,
cabelo asa de corvo; da angústia da cara,
nariguete que sobrepuja de través
a ferida desdenhosa e não cicatrizada.
Se a visagem de tal sujeito é o que vês
(omita-se o olho triste e a testa iluminada)
o retrato moral também tem os seus quês
(aqui, uma pequena frase censurada...)
No amor? No amor crê (ou não fosse ele O'Neill!)
e tem a veleidade de o saber fazer
(pois amor não há feito) das maneiras mil
que são a semovente estátua do prazer.
Mas sobre a ternura, bebe de mais e ri-se
do que neste soneto sobre si mesmo disse...




*



Que queriam fazer de mim?


Uma palavra ,um gemido obsceno,
Uma noite, sem nenhuma saída,
Um coração que mal pudesse
Defender-se da morte,
Uma vírgula trémula de medo
Num requerimento azul, azul,
Uma noite passada num bordel
Parecido com a vida, resumindo
Brutalmente a vida!

A chave dos sonhos, o segredo
Da felicidade, as mil e uma
Noites de solidão e medo,
A batata cozida do dia a dia,
O muscular fim - de - semana,
As sardinhas dormindo,
Decapitadas, no azeite,
O amor feito e desfeito
Como uma cama
E ao fundo - o mar ...

Mas defendi-me e agora escrevo
Furiosamente, agora escrevo
Para alguém...

Lembras-te, meu amor, dos passeios que demos
Pela cidade? Dos dias que passámos
Nos braços da cidade?
Coleccionámos gente, rostos simples, frases
De nenhum valor para além do mistério
Também simples do nosso amor.
Inventámos destinos, cruzámos vidas
Feitas de compacta vontade,
De dura necessidade, rostos frios
Possuídos por uma ausência atroz,
Corpos extenuados mas sem nenhum sono para dormir,
Olhos já sem angústia, sem esperança sem qualquer
Pobre resto de vida!
Seguimos a alegria das crianças, agressiva
Como o carvão riscando uma parede,
Aprendemos a rir (oh que vergonha!)
Com a gente ordinária e calados
Descemos até ao rio - e ali ficámos
A ver!




Ou a entrada em falso da primavera



A memória de uma amante
não nos aquece os pés.



Another slow show






(check out the groove on those little girls)

Por estes dias...



o porto é oporto




quinta-feira, 20 de março de 2008

The sentinel




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Ponte de Lima, Fevereiro 2008



quarta-feira, 19 de março de 2008

quarta-feira, 12 de março de 2008

segunda-feira, 10 de março de 2008

3 poemas de Albano Martins




Asas que fossem, tuas
mãos podiam
tocar a íntima
nervura do silêncio.



*



De ti fiz a harpa e a lira,
a guitarra.

Outra música não sei.



*



A noite é uma página escrita onde há uma vírgula depois de cada
letra, um ponto depois de cada palavra, uma exclamação no fim de cada
frase. Ao fim de cada período está o teu corpo, aberto num parêntese
longo, que explica a súbita eclosão de auroras nocturnas.
No fim de tudo estão os teus olhos, redondos como duas afirmações,
loiros e despenteados.





domingo, 9 de março de 2008