quarta-feira, 31 de outubro de 2007

Check for pulse





Don't get any big ideas
They're not going to happen












And now that you've found it- its gone
and now that you feel it- you don't
You've gone off the rails











sábado, 27 de outubro de 2007

quarta-feira, 24 de outubro de 2007






Gostava quando trazias o cabelo preso
(como quem amarra a alma ao corpo)

Agora o teu cabelo cresce
para longe.







terça-feira, 23 de outubro de 2007







Alguém entrou na memória branca, na imobilidade
do coração.

Vejo uma luz debaixo da névoa e a doçura do erro
faz-me fechar os olhos.

É a ebriedade da melancolia; como aproximar
o rosto de uma rosa doente, indecisa entre o perfume e
a morte


Antonio Gamoneda





sábado, 20 de outubro de 2007







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Nuvem de acácia
alva e púrpura de
ternura

tão tua
e tão nua.

Um só corpo de água:
o teu sobre o meu
como um céu.















quinta-feira, 18 de outubro de 2007

3 poemas de João Luís Barreto Guimarães




Trinta

Hoje aconteceu-me mais um cabelo branco
(não sei se tinhas dado com este:)
fica
mesmo ao lado da risca entre os
vinte e nove e
os trinta. O
dia de amanhã já existe ora
(a hora nas agendas)
lembra uma camisa limpa que
drapeja ao secar
(cada dia que me aceita
propõe
novo recomeço).
Todos temos uma alma gémea
frente ao espelho
tinha feito 15 anos
(hoje acatei outros quinze)
foi sempre no gesso da idade
que
assinei o poema.



*


1 de Fevereiro

A mesa do casal de idosos guarda agora apenas um.
Está vestido de negro, e eu não consigo evitar a imagem da mulher,
sentada ainda a seu lado, servindo-lhe chá e torradas
ou aparecendo atrasada repetindo como há anos o fiel toque de lábios,
desculpando-se num sorriso pela demora na quermesse.
Agora é apenas ele quem cumpre o ritual das torradas
que barra e pousa num prato à frente do fantasma dela.
Alguém lhe vai ter que dizer que ela já foi à frente.
Alguém lhe vai ter que lembrar que ele é quem está atrasado.


*


4 de Abril

Um pingo de café desliza pela base da chávena
e cai sobre o papel onde escrevo.
Acidente de trabalho.




quarta-feira, 17 de outubro de 2007

domingo, 14 de outubro de 2007








Há alguém que escreve
ao fundo da casa.
Escreve com o corpo
intumescido de medo.

Está à espera
da loucura sob o peso
pungente da noite.
O silêncio devora-lhe
a boca.

Protege-se com as mãos dolorosas
com que trabalha o poema
e move-se como um corpo
que há muito desaprendeu
a luz.

Está ao fundo da casa
como uma lâmpada apagada

e escreve

como um abismo em
exsudação.





sexta-feira, 12 de outubro de 2007

quarta-feira, 10 de outubro de 2007



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Se o fogo destruir a casa
e apagar a cal que caia a casa
onde irei escrever o teu nome?

E se não escrever o teu nome
como direi a alegria ao mundo?

Ainda que vigie como um sistema de alarme
e encha a minha boca com sirenes
como direi na minha casa em chamas
que és a única luz?

O chão carbonizado é a erosão do meu destino
respeito o luto e não vou abrir caminhos:
mas se tu és também o incêndio
como não rebento na cinza?

E se o fogo destruir o homem que caia a casa
e apagar o coração
como explicarei aos sem abrigo
o teu auxílio?

O relento não pode vergar-me
porque sou mais resistente do que o hissope:
mas se o fogo consome o sopro que me mantém de pé
que chama porei na fronte quando o teu anjo vier?



Daniel Faria
"Homens que são como lugares mal situados"



terça-feira, 9 de outubro de 2007

sábado, 6 de outubro de 2007











Devia morrer-se de outra maneira.
Transformarmo-nos em fumo, por exemplo.
Ou em nuvens.
Quando nos sentíssemos cansados, fartos do mesmo sol
a fingir de novo todas as manhãs, convocaríamos
os amigos mais íntimos com um cartão de convite
para o ritual do Grande Desfazer: "Fulano de tal comunica
a V. Exa. que vai transformar-se em nuvem hoje
às 9 horas. Traje de passeio".
E então, solenemente, com passos de reter tempo, fatos
escuros, olhos de lua de cerimónia, viríamos todos assistir a despedida.
Apertos de mãos quentes. Ternura de calafrio.
"Adeus! Adeus!"
E, pouco a pouco, devagarinho, sem sofrimento,
numa lassidão de arrancar raízes...
(primeiro, os olhos... em seguida, os lábios... depois os cabelos... )
a carne, em vez de apodrecer, começaria a transfigurar-se
em fumo... tão leve... tão subtil... tão pólen...
como aquela nuvem além (vêem?) — nesta tarde de outono
ainda tocada por um vento de lábios azuis...



José Gomes Ferreira



quarta-feira, 3 de outubro de 2007




Escrever o Outono.

Abraçar o cansaço dos ramos
que já não sabem tecer
a própria sombra.

Estancar o olhar
na velhice das cores
que coroam o silêncio.

Perscrutar a antiga nudez das árvores
e pensar as folhas caídas
como memórias dolorosas.

Escrever o Outono

e sujar os dedos
na sua melancolia.



segunda-feira, 1 de outubro de 2007




1.

Acordei com as narinas a sangrar um perfume
como um santo quando acaba de morrer
e debrucei-me para dentro
para encontrar o golpe no sono.
Encontrei uma mulher sentada entre os pássaros
que quebrava vasilhas de barro.
Disse-lhe: bebe do meu sangue.
E ela rasgou-me as veias com cacos
e deu de beber aos pássaros.

2.

Acordei também com os pássaros
e estudei a posição em que os bordava
nos seus vestidos
e disse: para que lhes espetas a agulha no coração
e ela respondeu: para que aprendam a direcção do voo

3.

Ela pôs-me o dedal sobre os olhos
um vaso pequenino com que me ministrou o sono
apagou em mim os instintos da caça.
Estou ferido nas narinas e nos pulmões,
digo-lhe: sufoco.
Ela ordenou que os pássaros batessem as asas
e fez circular o ar.

4.

Acordei dentro do poço
do ar
e soube que podia respirar dentro da água
porque a mulher estava cercada de peixes.
Disse-lhe: porque quebras aquários contra os joelhos?
Ela mastigava e não me respondeu,
estendeu a mão e deu-me um vidro a provar.

5.

Trinquei o vidro e ouvi o coração da mulher estalar:
a mulher era uma ilha de todos os lados
na sua força de redemoinho parado.

6.

Ela sorveu-me o sangue, curou-me a boca,
espetou-me um anzol na língua e puxou-me
as palavras.
foi então que pensei que ia morrer
afogado.

7.

Acordei dentro desse pensamento como um homem salvo
com a boca cheia de búzios em forma de palavras.
soube que era possível respirar dentro das palavras
porque vi a mulher pôr as mãos sobre os ouvidos.
Ela estava no meu pensamento e tinha um pequeno tear.

8.

E eu disse à mulher: destece-me
até que alguma coisa me pense para dentro
como se alguém me chamasse
como se badalasse um sino ao redor
dentro de mim.
A mulher pôs-se à escuta: perdi o fio - disse-
dos teus novelos.

9.

Assemelhei-me a um xilofone de silêncio
a um estrondo muito forte que só se ouvia em silêncio.
Gritei: então canta!
Ela pegou na minha tristeza e começou a dobar.

10.

Debrucei-me sobre a meada estreita, o estreito poço
e disse: é agora que vou descer.
Acordei no meio da descida e pensei:
ah, quem dera a mulher lançasse a sua trança
a prumo.



Daniel Faria
Homens que são como lugares mal situados








Espaços perdidos




Sombras ancestrais
claras manhãs
em que margem ?
Ainda que a memória esbata as horas
o que há são espaços perdidos
uma casa
uma viagem
cabelos soltos em minhas mãos



Júlio Castañon Guimarães